Respostas a entrevista ao Diário Insular. O título é da responsabilidade do jornal.
Frederico cardigos, diretor regional dos assuntos do Mar
1 – A campanha SOS Cagarro recolheu este ano menos cagarros do que é hábito. Os cidadãos, que costumam acompanhar com interesse essas aves, questionam-se sobre as causas. Já há algumas ideias?
Há menos cagarros. O problema não é novo e ninguém sabe qual a sua motivação ou como o debelar. No entanto, este decréscimo é lento e, a curto ou médio prazo, não coloca em perigo a espécie desde que, curiosamente, se mantenha a “Campanha SOS Cagarro”. O número de aves salvas todos os anos pelos açorianos, seja maior ou menor, é crucial para a sobrevivência da espécie.
O que se passou este ano foi um decréscimo muito acentuado no número de aves nidificantes. Para este decréscimo, aponta-se a possibilidade de ter havido menos alimento. Sendo esta uma espécie muitíssimo bem adaptada, a melhor forma de garantir que o casal reprodutor não se esgota com uma tentativa de nidificação inconsequente, dada a escassez de alimento, é passar para o ano seguinte.
No entanto, segundo os cientistas, as poucas aves que se reproduziram fizeram-no com sucesso. Isso faz com que a pergunta se mantenha. Onde estão as aves que deveriam ter sido salvas? A resposta parece estar nas boas condições atmosféricas que se fizeram sentir nos dias de mais saídas dos ninhos e na enorme redução de luminosidade consequente à própria Campanha e às medidas de contenção energética. Os cagarros, na sua maioria, puderam sair dos ninhos e partir imediatamente em segurança para a sua viagem transatlântica.
2 – Com a persistente falta de alimentos, como é aparente, haverá alguma possibilidade de alteração das rotas de migração dos cagarros, excluindo os Açores?
Não temos dados que apontem para um decréscimo de alimento a longo prazo a influenciar negativamente e em particular os Açores. Este, até prova em contrário, foi um fenómeno pontual. Para além disso, os cagarros nidificam no mesmo local ano após ano. Isso significa que estes animais são açorianos, aconteça o que acontecer.
3 – Os cagarros têm tido muito protagonismo nos Açores, pelo menos nos últimos anos. Isso pode ser bom e mau. Qual o balanço que faz e porquê?
É excelente. É evidente que pode haver excessos e esses terão de ser rapidamente debelados. No entanto, recordo-me das mortandades que havia de cagarros há uns anos atrás, tanto para alimentação, como por puro vandalismo ou por acidente. Hoje é bem diferente e para muito melhor. Há milhares de pessoas empenhadas na salvaguarda das aves, houve uma redução radical na iluminação pública, os cagarros já saíram da gastronomia tradicional e há outro cuidado na condução.
4 – Ver aves e “mexericar” os seus habitats é um ramo do turismo que ganha mercado à escala global. Vê nos cagarros potencial para esse negócio?
Sim. Curiosamente, este será um tema que teremos de tratar neste Inverno. Os cagarros, como todas as aves selvagens, estão protegidos, mas há interesse já demonstrado por empresas privadas e associações na exploração económica dos salvamentos. Obviamente, não podemos recusar a ajuda e, também, devemos dinamizar a economia. No entanto, terão de ser desenvolvidas regras, talvez incluindo o acompanhamento por Vigilantes da Natureza, garantindo que não se irão “salvar” cagarros ao ninho…